Aposta em São Paulo

Em meio à pandemia, marcas estabelecidas em outras praças desembarcam no maior mercado gastronômico do País

Fotografia: Divulgação
Juan Saavedra

Juan Saavedra

A pandemia foi implacável com muitos restaurantes paulistanos. Especialmente nos 15 meses iniciais, muitos não resistiram às restrições de funcionamento e baixaram as portas definitivamente. Em abril, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-SP) divulgou que cerca de 12 mil bares, restaurantes e lanchonetes fecharam na cidade de São Paulo.

A capital, no entanto, seguiu cobiçada. De olho no maior mercado, marcas estabelecidas em outras regiões brasileiras, e até no exterior, aproveitaram para fincar os pés em território paulistano.

O caso mais recente é o Vasto. Inaugurado em 10 de dezembro, na Haddock Lobo, nos Jardins, o restaurante já representa a quarta unidade desse relativamente novo empreendimento do grupo Coco Bambu. A marca havia sido lançada em Brasília no começo de 2020 – e neste ano vieram mais duas lojas (Brasília e no Recife).

"O lockdown adiou os planos por conta das incertezas", admite à GULA o sócio-fundador do Vasto.  "Porém, com o sucesso de uma rápida retomada após a reabertura, tivemos a convicção de que ampliaríamos aceleradamente. O conceito do restaurante encaixou ao ponto que apareceu como uma oportunidade, um local super nobre", acrescenta ele, referindo-se ao endereço antes ocupado pela filial paulistana da rede internacional de restaurantes Nobu.

São aproximadamente R$ 15 milhões em investimentos, segundo a holding. A proposta é inspirada em restaurantes novaiorquinos. Um bar americano central, inclusive, é a estrela do espaço de aproximadamente 1.400 metros quadrados, com capacidade para até 350 lugares. A descontração fica por conta de apresentações de música ao vivo no almoço e jantar ao som de blues, jazz e soul.

O menu tem a assinatura da chef executiva e sócia-fundadora Daniela Barreira. É baseado em carnes nobres, com seções destinadas a sushis, frutos do mar, saladas e sanduíches. O menu inclui drinks autorais e clássicos da coquetelaria.

Segundo Barrera, agradar ao público paulistano não chega a representar um desafio extra.

"O perfil exigente dos nossos clientes está em todas as praças", afirma.

O empresário cearense diz ainda acreditar no potencial de crescimento do Vasto, a exemplo da marca mais famosa da holding. "É o estado que já tem a maior quantidade de operações do grupo Coco Bambu no Brasil", completa.

DICKEY’S: MARCA IMPORTADA DO TEXAS

O otimismo com a melhora do quadro sanitário levou dois sócios brasileiros a um desafio maior: lançar no Brasil a primeira unidade da América Latina do Dickey's. Fundada em 1941, a cadeia de churrasco texano, dona de 550 lojas só nos Estados Unidos, confiou à dupla de empresários Cyro Xavier e Bruno Gallucci a franquia master não só em São Paulo, mas em todo o Brasil.

A primeira unidade latino-americana da marca fica na Alameda Santos, nas imediações da Avenida Paulista. O investimento inicial é de R$ 15 milhões, consumidos na compra da master franquia, estruturação e abertura de três lojas próprias, também em São Paulo, até o primeiro semestre de 2022. O plano é ambicioso: a previsão é abrir 110 lojas no Brasil em dez anos.

De acordo com o Gallucci, uma das principais preocupações dos sócios era manter o padrão do preparo por defumação – alguns cortes ficam até doze horas no pit smoker. Um dos orgulhos é o brisket, nome americano dado ao peito bovino. O corte tradicional inclui o flat (mais magro) e o point (mais marmorizado e suculento). O ticket médio é de pouco mais de R$ 50, o que atrai um público diverso – desde grupos de adolescentes de escolas particulares vizinhas até moradores de terceira idade que moram nas imediações da Paulista.

Para obedecer ao rigor dos criadores da marca, a casa brasileira importa até mesmo as lenhas locais e os temperos típicos do Texas, segundo o pitmaster Arthur Fumis, que conheceu a rede americana em viagens de pesquisa pela América.

Antes de iniciar as operações, entretanto, os sócios brasileiros pleitearam ligeiras adaptações para a cultura brasileira. Uma delas foi a adoção de uma preferência nacional – o cupim. Outra foi a introdução da farofa. As ideias foram aprovadas – e provadas pessoalmente – pelo vice-presidente internacional da companhia, Jim Perkins. De acordo com os sócios, o endosso foi fundamental para realizar esses ajustes no cardápio. “Nossa preocupação sempre foi a de preservar a essência do Dickey's”, diz Gallucci.

KISŪ: JAPONÊS SOFISTICADO SURGIU NO RECIFE

Comandante de jatinhos, o aviador Ângelo Vieira teve a chance de conhecer a cozinha de diversos países ao longo dos mais de 30 anos em que transportou executivos em voos internacionais. Mas a paixão bateu mais forte pela gastronomia japonesa. Ao lado de amigos, virou sócio do KISŪ, um restaurante inaugurado em 2013 no Recife (PE) com inspiração novaiorquina – a referência principal era o Nobu. 

Em Pernambuco, o KISŪ logo se tornou um sucesso e parada quase obrigatória de globais que visitavam Recife. Em janeiro de 2020, os sócios convidaram o chef Anderson Haruo, duas vezes estrela Michelin e professor da Le Cordon Bleu, para assumir o comando de um plano ambicioso: levar a experiência do KISŪ para mais longe. "Não temos mais como esperar. Vamos para São Paulo", disse Vieira ao chef.

A pandemia adiou um pouco os planos, mas em setembro de 2020, quando a situação começou a melhorar, os sócios ficaram animados e decidiram concretizar. Encontraram um ponto em vantajosas condições para locação na Melo Alves, nos Jardins, onde antes funcionava o Café Amsterdã, e começaram o projeto. Contrataram uma arquiteta para criar um ambiente mais cosmopolita e definiram o novo cardápio, que tem diferenças em relação ao restaurante original. "Em São Paulo estou mais próximo dos fornecedores – até do salmão chileno", observa Vieira.

O soft opening aconteceu em maio. "Muita gente falou que éramos loucos de inaugurar algo em plena pandemia. Era um risco, mas decidimos que era o momento", comenta o empresário. "O que queremos proporcionar é a experiência. Um dos nossos diferenciais é o serviço", acrescenta.

E a experiência vem sendo garantida com a contratação, em outubro desse ano, do chef Rodolfo Yusa, que assumiu o posto deixado por Haruo. Yusa, que já havia passado pelo KISŪ Recife e liderou a cozinha do Ushin Japanese & Grill, no Grand Hyatt de Bogotá.

Um dos destaques é omakassê (R$ 275,00), menu degustação que inclui peças como o salmão selado na manteiga da Normandia e o sashimi kisu, composto de salmão, atum e linguado supertemperado com rodelas de tomate sweet grape, ovas de massagô, esferas de shoyu, azeite e limão siciliano.

"O mercado é aqui. Qualquer atividade em que você queira um nível mais elevado tem que passar por São Paulo. É uma cidade com timing, dinamismo e muita cobrança. Como aviador sentia isso. E na gastronomia não é diferente. Era um sonho marcar presença aqui."

REDES NORDESTINAS 

A capital paulista é igualmente cobiçada por grandes redes nordestinas. Na esteira do Coco Bambu e do Mangai, a cidade recebeu no último ano, em plena pandemia, outras duas grandes redes: Camarada Camarão (Pernambuco) e Camarão (Rio Grande do Norte).

Para os irmãos Clara e Gabriel Medeiros, sócios da rede Camarões, o restaurante criado em 1989 foi precursor do modelo de negócio baseado na experiência com frutos do mar. E a cidade de São Paulo era o destino ideal quando decidiram instalar a primeira unidade fora do Rio Grande do Norte. "É uma cidade múltipla, com uma população diversa, que aprecia a gastronomia e gosta de sair para comer", comentam em nota enviada à GULA. A receptividade, segundo eles, tem sido ótima. "Muitos dos clientes já nos conheciam de Natal."

Inaugurado no final de 2020, o Camarada Camarão chegou a São Paulo depois de botar os pés no Rio de Janeiro. Um dos motivos era encontrar o ponto certo – o modelo da rede foca em lojas alocadas em áreas gourmets de shoppings.

"São Paulo sempre esteve nos nossos planos. É um mercado espetacular, pujante e competitivo. Para nós, é uma ótima oportunidade de mostrar que estamos no páreo", diz o empresário Sylvio Drummond, referindo-se à briga com os demais gigantes do setor.

O Camarada Camarão já chegou com apetite. São três unidades – uma na Avenida Paulista e as demais em Campinas e Santo André. "Nosso plano de expansão é ousado, o tamanho do mercado que o Estado representa. Estamos estudando diversos pontos na capital, região metropolitana e interior", acrescenta Drummond.

Segundo ele, a migração de marcas nordestinas deve ser vista com normalidade. "A gastronomia nordestina é riquíssima. Nada mais natural do que ganhar seu espaço pelo País.”

Serviço:

Camarada Camarão
Shopping Cidade São Paulo | Av. Paulista, 1230 - Bela Vista, São Paulo
@camaradacamarao

Camarões
Av. Pres. Juscelino Kubitschek, 627 - Vila Nova Conceição, São Paulo
@camaroes.sp

Dickey's Brasil
Alameda Santos, 843 - Jardim Paulista, São Paulo
@dickeysbrasil

KISŪ Japanese Cuisine
Rua Doutor Melo Alves 506, Jardins - São Paulo
@kisusp

Vasto Restaurante
Rua Haddock Lobo, 1573 - Cerqueira César, São Paulo
@vastorestaurante