Tem vinho sobrando

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Alexandre Lalas

Alexandre Lalas

As coisas não estão fáceis para os produtores de vinhos australianos. A retração do mercado gerou um excesso de estoque tão grande que muitas empresas estão arrancando vinhas, além de venderem o vinho excedente com descontos expressivos. 

O que está acontecendo na Austrália encontra eco em outros países produtores de vinho. A França mesmo coordenou um arranque brutal recentemente, justamente pelos mesmos motivos. Segundo a Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV), a produção global de vinho excedeu a demanda em 10%, em 2023. Ou seja: há mais vinho para vender do que gente para comprar. 

No caso particular australiano, a situação fica ainda pior por conta das querelas com a China. Até 2020, os chineses eram os maiores compradores de vinhos da Austrália. No entanto, uma guerra comercial e diplomática fez com que as fronteiras do gigante asiático se fechasse aos vinhos australianos, complicando brutalmente a vida de muitos produtores do país. 

A Austrália bem que tentou recuperar o prejuízo apostando em outros mercados, mas encontrou um cenário pouco animador de retração nas vendas e disputas selvagens por preço baixo. Segundo estatísticas oficiais da OIV, o consumo de vinho diminuiu 4,5% no Reino Unido, 2,7% nos EUA e 2% na França em 2023. Enquanto isso, o consumo doméstico de vinho da Austrália também caiu 1,7%.

Para quem, em meados do ano passado, tinha mais de 2 bilhões de litros de vinho em estoque, não é um quadro muito animador. Tal retrato do mercado tem feito diversos produtores a arrancar vinhas e plantar outras culturas. 

“Há um limite de tempo que podemos continuar cultivando uma safra e perdendo dinheiro com ela", disse James Cremasco, um produtor de quarta geração em Riverina, à agência de notícias Reuters, enquanto observava as escavadeiras arrancando as videiras plantadas por seu avô.

Ao mesmo tempo, os custos de combustível e fertilizantes estão aumentando em uma nova era de alta inflação, o que desestabilizou o delicado modelo econômico do vinho, de acordo com analistas de mercado da IWSR.

Grandes produtores, como a Treasury Wine Estates, estão refinando as estratégias e se concentrando mais em vinhos caros, que ainda estão vendendo bem.

Andrew Calabria, um vinicultor de terceira geração em Riverina, disse que a sensação é de fim de uma era. Seu pai, Bill, nome histórico na produção de vinho na Austrália, acrescentou que as vinícolas estão "praticamente doando" os estoques excedentes para abrir espaço para a próxima safra. Os produtores da região estão plantando árvores frutíferas e nogueiras onde antes havia videiras.

Outro produtor, Tony Townsend, disse à Bloomberg que destruiu metade de seu vinhedo de 14 hectares no ano passado, apesar de as videiras estarem perfeitamente saudáveis.

O consumo global de vinho atingiu o pico de 25 bilhões de litros em 2007, mas está em declínio desde então. Os números da OIV mostram que ele caiu para menos de 23 bilhões de litros em 2022, e a IWSR previu outro declínio de 1% em 2023.

O problema não se limita, de forma alguma, à Austrália. A Califórnia está lutando com "um dos piores desequilíbrios de demanda e oferta que já vimos em 30 anos", de acordo com a Lodi Winegrape Commission.

Enquanto isso, o governo francês está gastando 200 milhões de euros (£171,5 milhões) arrancando videiros e destruindo vinhos, em uma tentativa de sustentar os preços e apoiar os produtores em dificuldades.

A KPMG estima que 20.000 hectares de videiras precisarão ser destruídos na Austrália para acabar com os problemas de excesso de oferta.

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