(R)evolução nos Vinhos Verdes

Fotografia: Divulgação
Eduardo M. Araújo

Eduardo M. Araújo

Um dos maiores desafios das mais tradicionais regiões vinícolas do mundo é modernizar-se, inovar e agregar valor ao seu vinho, mantendo ao mesmo tempo as tradições e essências que a caracterizam. Essa tarefa é especialmente desafiadora para as Comissões Regionais, que estabelecem as regras do que pode ou não ser feito dentro das Denominações de Origem.

 

Ao visitar a região dos Vinhos Verdes e a Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV), ficou evidente que essa região está se transformando. Os Vinhos Verdes representam 12% do total de vinhos produzidos em Portugal, e mexer em um "time que está ganhando" não é tarefa fácil. Contudo, a região busca diversificar sua produção e aumentar o valor agregado, destacando as características individuais das castas locais e das suas nove sub-regiões.

"A comissão faz um painel de provas para entender os diferentes estilos que estão sendo feitos e uma forma de os produtores conseguirem ter espaço para diversificar o portfólio, exercendo sua criatividade na região", destaca Dora Simões, presidente da CVRVV.

Atualmente, os Vinhos Verdes estão em plena ebulição, com novos produtores, frequentemente em projetos pessoais e pequenos, ao lado dos tradicionais produtores e cooperativas, trazendo inovações. Historicamente, a região já passou por grandes mudanças; há poucas décadas, era predominantemente produtora de vinhos tintos. Hoje, mais de 20% das garrafas de Vinhos Verdes estão no segmento premium (acima de $10), e cada vez mais rótulos são identificados por sub-região.

A vasta região, com diferentes influências climáticas, possui o Atlântico e seus rios como moderadores, além de encostas e áreas continentais que permitem uma ampla expressão das castas permitidas. Isso facilita a adaptação às novas realidades climáticas. "Quanto às mudanças climáticas, a Comissão dos Vinhos Verdes tem uma quinta onde desenvolve pesquisas aplicadas junto à universidade para observar os vinhos, as castas e os clones, verificando a adaptação das castas autóctones da região ao clima e entendendo o perfil enológico para dar aos produtores mais informações para o cultivo e produção", explica Dora Simões.

A ascensão de vinhos brancos premium, junto com novas propostas como Pétnats, rosés gastronômicos e diversas expressões de tintos, tem atraído a atenção de sommeliers ao redor do mundo. Visitar a região revela que até os grandes produtores, que continuam a fabricar seus campeões de vendas, estão investindo em projetos de "garagem", com edições limitadas e experimentos inovadores. Uma tendência notável é a busca pelas melhores expressões monocastas. Provar um Avesso de Baião, um Loureiro de Lima ou um Alvarinho de Melgaço permite uma compreensão profunda dos terroirs e das razões históricas para a adaptação dessas variedades às sub-regiões, além do papel delas nos blends tradicionais.

Luis Cerdeira, e Soalheiro, compartilha essa visão de inovação contínua. "Olhamos para a inovação como uma atitude que está presente no Soalheiro desde o primeiro momento. A primeira inovação do Soalheiro faz agora 50 anos - a nossa primeira vinha, que foi a primeira vinha contínua de Alvarinho em Melgaço, plantada numa parcela da família chamada Soalheiro. [...] Em 1995, criámos o primeiro Espumante de Alvarinho. Em 2006 voltamos a ser pioneiros na região ao obter a certificação biológica das vinhas. [...] Nos últimos anos na Cave da Inovação temos continuado esta vontade de levar o Alvarinho ao limite, de arriscar, não só para seguir as tendências de mercado, mas para seguir a nossa visão, a nossa paixão: uma procura contínua por valorizar o Alvarinho e refletir, com a maior precisão possível, a diversidade deste território único."

O que mais impressiona os degustadores é a longevidade desses vinhos, inclusive alguns considerados mais simples, e como eles evoluem, adquirindo notas mais complexas enquanto mantêm sua acidez natural. Agora, os produtores, cientes desse potencial, podem explorar desde o vinhedo as capacidades de evolução desses brancos, criando verdadeiras obras-primas.

Luis Cerdeira também destaca o compromisso ambiental da Soalheiro, que se reflete em muitos outros produtores de lá: "O respeito pelo território, pelo ambiente, tem de estar sempre no centro da nossa evolução. Na modernização da adega, instalamos uma cobertura vegetal que trouxe uma poupança energética estimada de 26% ao ano. A biodiversidade é uma grande preocupação nossa, por isso temos também recentemente apostado nas infusões biológicas, o recuperar de uma tradição antiga no território, para promover a diversidade de culturas no território.” Ele afirma que os vinhos só se beneficiam com esses caminhos, porque os solos tem melhor saúde e eles conseguem mais conhecimento das vinhas, elevando a qualidade das uvas e diferenciando perfis específicos que chegam destas evoluções.

Outra revolução está ocorrendo com os vinhos tintos, que estão voltando ao holofote. Alvarelhão, alguns que achei lindas inspirações do Jura, mas com cara de Vinhos Verdes, inclusive vindo de vinhas em ramada, tintos em vinhas velhas fermentadas com cachos inteiros ou expressões da clássica Sousão mostrando sua intensidade em vinificações mais clássicas são apenas algumas das novas interpretações. Pude provar dezenas desses novos tintos, e a impressão é que assim como nos brancos o potencial é enorme e estão apenas começando a brilhar com mais destaque.

Essa é a (R)evolução nos Vinhos Verdes: uma região em constante adaptação, mantendo suas raízes enquanto abraça o futuro.

*Eduardo M. Araújo, sommelier, é embaixador da Região Demarcada dos Vinhos Verdes no Brasil