Os partidos do vinho

Conheça as iniciativas de Bordeaux e da Borgonha

Fotografia: Divulgação
Marcel Miwa

Marcel Miwa

Nesta semana foi formalizado o nascimento do grupo Union das Vignerons Bordeaux Pirate. Neste princípio, trata-se de uma união de 10 produtores bordaleses que compartilham a cartilha de viticultura orgânica, com vinhedos dentro dos limites de Bordeaux, que aportem alguma novidade no cenário dos vinhos locais e que sejam aprovados por um comitê de degustação, que deverá analisar a qualidade de cada vinho e o caráter inovador da amostra.

Jean-Baptiste Duquesne, do Château Cazebonne (Graves), é fundador e líder do grupo, e está plantando 57 variedades que catalogou como típicas da região de Bordeaux. Hoje já possui 26 variedades plantadas, resultado de um trabalho de cinco anos. “Queremos ser uma terceira via, entre os Cru Classé e os vinhos à granel de Bordeaux”, comentou Duquesne, argumentando que os primeiros precisam de muito tempo e dinheiro para serem consumidos e as garrafas acabam no esquecimento dentro das adegas. O próprio comitê interprofissional de Bordeaux emitiu comunicado vendo com bons olhos a iniciativa. “Há 50 anos atrás, havia mais brancos que tintos em Bordeaux. Hoje os tintos são 90%. Quem sabe daqui a vinte anos não teremos mais cuvées piratas. As inovações fazem parte da história de Bordeaux”.

Na Borgonha, um partido mais democrático e abrangente tem se destacado pela plataforma: preservar a variedade Aligoté. Denominado Les Aligoteurs, o grupo reúne nomes de excelência da nova geração da Borgonha, como Dureil-Janthial, Sylvain Pattaile e François Mikulski, e alguns peso-pesados tradicionais, como Domaine de Villaine, Marquis d’Argerville e Domaine Ponsot.

A certa rusticidade da variedade, resultado do cruzamento natural da Pinot Noir com a Gouais Blanc, por muito tempo tinha como maior predicado ser a base principal do cocktail Kir (Aligoté e licor de cassis). Com os novos extremos climáticos que têm jogado a favor do amadurecimento mais consistente da casta e com tratamento de primeira no campo e na vinificação, os resultados já ultrapassam o objetivo de preservação e tem propagado as virtudes da Aligoté, participando de feiras e degustações por toda a França. Dos cerca de 2.000 hectares plantados com a variedade na França, 80% está na Borgonha, e obviamente o preço mais acessível diante da disparada de preços da Pinot e Chardonnay bourguignons, tem ajudado no boom da Aligoté.

E no Brasil? Seguramente há espaço para a criação de grupos de produtores com ideias semelhantes. Os “Danis" (Vinhas do Tempo), os “Edus" (Cata Terroir) ou os “Ricardos” (Rio Sol; sim, o projeto português do Vale do Rio São Francisco), independentemente do tamanho ou geração, certamente possuem pontos em comum para ganharem com uma dinâmica associativa ou, no mínimo, um intercâmbio cultural. Aguardemos os manifestos dos partidos locais.