Delivery interativo

Fotografia: Divulgação
Juan Saavedra

Juan Saavedra

Como alternativa à pandemia, restaurantes como Lasai e MoMa criam opções de pratos que demandam a finalização na casa do cliente; nas instruções aos consumidores são usados QR Code, Instagram e até mesmo o Zoom

 

Deixou de ser uma escolha. Com a pandemia, ingressar no delivery, de certo modo, virou uma opção de sobrevivência. Até mesmo para chefs renomados. No Lasai, um dos cinco restaurantes cariocas com estrela Michelin, o chef Rafa Costa e Silva abriu em junho um novo negócio – o Lasai Empório.  Em São Paulo, o mesmo movimento foi feito pelos chefs Salvatore Loi e Paulo Barros, da trattoria Moma - Modern Mamma Osteria, que acumula dois destaques na Veja Comer & Beber. Em comum? Ambos têm opções que demandam a finalização pelos clientes.

 

"Nosso primeiro objetivo com kit era continuar levando uma comida fresca e saborosa aos nossos clientes, e aproveitar o período de isolamento social, em que toda família estava em casa, para tornar a hora da refeição um momento interativo entre todos", afirma Rafa, como os amigos o chamam, em entrevista à GULA.

foto de Rodrigo Azevedo/Divulgação

 

O Lasai Empório foi uma resposta ao momento da pandemia, segundo o chef carioca. "Com o Lasai Empório, conseguimos continuar a apoiar os produtores locais, que durante esse período de isolamento tiveram uma baixa nas demandas, prejudicando seus faturamentos. Outro grande objetivo era manter nossa equipe, que, com o isolamento social e o restaurante fechado, ficaria parada."

 

Os kits da marca comportam a fome de duas pessoas. Contam com entrada, prato principal e sobremesa. No interior de uma caixa com design próprio há instruções de como montar os pratos. Um QR Code dá acesso direto a um vídeo didático que apresenta todos os ingredientes e dá o passo a passo. "Enviamos a comida pronta, ou seja, cozida, com todos os ingredientes selecionados, picados, molhos e temperos, ficando aos cuidados do cliente a montagem e finalização do prato", explica Costa e Silva.

A maioria dos pratos, como o Steak Tartar (na foto acima), está no menu do Lasai. São quatro opções de entradas e outras quatro de pratos principais, além de três de sobremesas, entre outros itens como conservas e bebidas. "Testamos e percebemos que eles viajam bem, ou seja, funcionam para esse formato de delivery. Fizemos adaptações como nos crocantes que usamos e em itens que dependem muito da textura para complementar os pratos."

 

Embora o Lasai não tenha feito uma pesquisa de satisfação, a receptividade tem sido ótima, garante Costa e Silva. "Os feedbacks são dados por Whatsapp, plataforma em que os pedidos são feitos, e usamos esse retorno para controle de qualidade. Fico feliz em dizer que 99% são retornos positivos."

 

O empreendimento foi fundamental nesses tempos difíceis, segundo o chef. "O Lasai Empório entra como um complemento em nosso faturamento. São propostas bem diferentes, e não temos custos extras para operação, pois os custos fixos já são nossos, como aluguel, e os funcionários foram realocados, uma vez que ainda não estamos operando a capacidade total do restaurante", assinala.

 

Com a reabertura gradual das atividades, o restaurante ainda tem menos público da unidade na loja no bairro de Botafogo, até mesmo por conta das necessárias medidas de distanciamento. Sua equipe, hoje, divide-se entre os dois negócios. "Assim, conseguimos manter nosso quadro de funcionários sem que seja necessário fazer cortes, já que o restaurante está com volume de trabalho menor. E, no futuro, quando as coisas voltarem ao ritmo normal, e se as vendas do Lasai Empório continuarem com o volume que temos atualmente, e acredito que sim, teremos a oportunidade de gerar novos empregos para atender à demanda do Lasai Empório."

 

As perspectivas parecem promissoras. O serviço foi ampliado para o mercado corporativo. Assim que os kits são entregues, o Lasai promove uma live. É o próprio Rafa Costa e Silva que ensina o passo a passo para clientes e funcionários das empresas que o contratam. As fronteiras do serviço foram expandidas. "Para esse formato estamos adaptando os kits e incluindo novas possibilidades no menu, com ingredientes não perecíveis, para que as caixas possam ser entregues em todo Brasil. Vamos fazer uma ação de 1.600 kits com uma empresa de Minas Gerais", comemora.

 


MOMA: PREOCUPAÇÃO COM QUALIDADE

Na trattoria paulistana MoMa - Modern Mamma Osteria, ingressar no delivery foi uma força das circunstâncias, mas não uma necessariamente representa uma aposta duradoura, diz um dos sócios. “É uma receita marginal. Não é uma coisa que a gente investe muito. A experiência do restaurante é mais importante", ressalta o chef Paulo Barros. Entretanto, apesar da reabertura do restaurante após a flexibilização permitida pelas autoridades, as entregas ainda são relevantes para otimizar a disponibilidade da equipe.

 

O único endereço do MoMa, no bairro Itaim, vem registrando um nível satisfatório de ocupação das mesas, ocupadas predominantemente por um público de perfil mais jovem. Segundo Barros, o faturamento já chega a algo próximo de 80% do período pré-pandemia, mas, com a redução do número de mesas, conforme ordenam os protocolos sanitários, a receita do delivery permanece relevante, equivalendo a 25% do total.

 

Nesse contexto, a ideia de produzir pratos semiprontos foi uma evolução natural. No início do lockdown, os sócios do MoMa observaram que a demanda dos serviços de entrega era muito alta e nem sempre os pratos chegavam nas condições ideais. "No delivery, a temperatura do prato nunca vai ser igual à que é servido no salão. Foi uma forma de atender ao público. O cliente recebe e pode servir com a temperatura e o frescor ideais", explica Barros.

 

São aproximadamente seis opções de massa, incluindo nhoque, lasanheta e ravióli. Tudo pode ser esquentado na água, sem sujar a panela, por apenas alguns minutos. Inclusive o molho, que vem em sachês. O kit, que inclui queijo ralado, vem acompanhado por um folheto com instruções, que também podem ser encontradas no Instagram.  O sucesso da ideia tem feito com que alguns clientes preventivamente peçam os kits para armazenar na geladeira, especialmente nos finais de semana ou na véspera de datas festivas como Dia dos Pais. "Os clientes entenderam isso. Se você compra com antecedência, não corre o risco de não conseguir em momentos com muito fluxo de pedidos", sugere Barros.

 


INSTRUÇÕES POR MEIOS DIGITAIS

 

Assim com o Lasai e o MoMa, muitos restaurantes e empresas de food service usam as redes sociais e outras tecnologias. Um dos ícones desses tempos, as reuniões online via Zoom, tem sido o território ocupado por Marília Alegre, da Rapariga. Depois de comandar por mais de 10 anos uma loja de vinhos na Barra da Tijuca, no Rio, Marília (na foto abaixo) criou um negócio para organizar eventos nas casas das pessoas. A ideia era promover um workshop de gastronomia enquanto promovia degustações. Com a quarentena, passou a fazer algo parecido, mas a distância. Envia kits para as pessoas em datas especiais, como Dia das Mães, enquanto interage em lives animadas.

Um de seus clientes é o ator Antônio Fagundes.  Ele a contratou para ensiná-lo a preparar e finalizar seus pratos prediletos. "Eu faço as compras, pré-preparo algumas coisas e ele finaliza tudo em casa. Entro no Zoom e falo com ele por uma ou duas horas", relata Marília.  "É maravilhoso", elogia Fagundes em áudio especialmente enviado à GULA. Segundo ele, facilita muito o fato de Marília escolher ingredientes como peixes e carnes. "Já tem meio caminho andado para poder cozinhar. E depois, eu faço as coisas com a orientação dela. Está sendo muito divertido e eficiente.

 

Na outra ponta, em uma escala mais industrial, a startup Liv Up usa um app proprietário e o Instagram para se comunicar com os clientes. Nessa plataforma, a marca traz receitas completas para orientar os clientes a incrementar o conteúdo dos congelados. Uma hashtag incentiva o compartilhamento de receitas.

 

Os congelados, entre eles camarão ao leite de coco com curry, já vêm cozidos e prontos para aquecimento no microondas ou banho maria. O tempo é sugerido nas embalagens, após processos de teste em que chefs da marca identificam a temperatura ideal para o ponto, cozimento e consumo de cada receita.

 

"A gente tem um cuidado extremo tanto na parte de embalagens como na parte de como se comunicar com esse cliente para que não tenha um garçom explicar o prato", diz Tatiana Lanna, que comanda a área de Cloud Kitchen. "Não tenho como perguntar se ele gostou tão facilmente. Então a gente tem um cuidado muito grande com o nosso produto", conclui.